Ser jovem em um mundo sem futuro
Dijaci David de Oliveira
Passada a temporada de matérias sobre o enterro da Rainha Elizabeth, as notícias se voltaram para o futuro da sociedade. Acompanhando os desdobramentos dos conflitos mundo afora, vários debates recentes me chamaram a atenção. Em particular, um dos temas importantes diz respeito ao futuro dos jovens. Em uma entrevista da jornalista Carla Jorge de Carvalho (Rádio Observador, 21/set/22), o Major-General Arnaut Moreira, ao discorrer sobre os desdobramentos da guerra Rússia x Ucrânia e o último discurso de Vladimir Putin, disse que “os jovens estão fugindo da Rússia” e que “vão procurar alternativas no estrangeiro!”

Compreensível considerando que, sendo jovem na Rússia, todos podem ser convocados para a guerra. Contudo, para onde vão? Para Portugal? Conforme outra matéria no site de notícias (Nascer do Sol, 20/set), o melhor que o jovem português deve fazer é fugir pois, conforme o autor do artigo – João Maurício Brás -, por aqui [Portugal] o que prevalece é a “podridão dourada a sol”. Já vimos que os jovens russos estão fugindo (os jovens ricos – e talvez a classe média -, claro, pois precisam ter dinheiro para as passagens aéreas, para os custos de moradia no exterior, para as despesas diárias…). É verdade que a situação de Portugal é bem mais confortável que a Rússia ou Ucrânia, por conta da guerra e das sanções econômicas. Mas o futuro imaginado pela sociedade está sempre além da mera repetição da vida tradicional. Mas, então, para onde vão os jovens portugueses?

Antes de responder, faço uma pequena digressão. Me recordei que neste ano (2022) Portugal bateu o recorde de entrada de brasileiros (foram milhares, e já ultrapassam os 300 mil totais). Podemos dizer que eles “fugiram” do Brasil (está é a verdade), se foram de um País que, sob o governo de Bolsonaro, perdeu seu futuro. Alguém em sã consciência acredita que Bolsonaro tornou o Brasil melhor? É evidente que não.

Mas enfim, qual país pode oferecer um futuro bom para os jovens? Se olharmos ao redor no planeta percebemos que há promessas de guerras em várias partes (Taiwan, Armênia, Síria, Iêmen, Etiópia, Mianmar). Noutras regiões do mundo acompanhamos a intensificação de conflitos políticos, fortes evidências de crises e instabilidades ambientais, além da queda das condições sociais. Nos países mais estruturados, experimentamos o fenômeno de recessão, da inflação e do desemprego. Ou seja, o mundo não tem boas notícias para oferecer aos jovens. Sobram problemas e desafios.
Mais ainda, o cenário do mundo tende a ser pior. Aqui e lá fora. É o que diz, por exemplo, Nouriel Roubine, o “profeta da desgraça” como o chamou a jornalista Carla Pedro (Jornal de Negócios, 20/set) ao noticiar uma projeção feita pelo famoso economista que previu a terrível crise imobiliária de 2007. Segundo ele, as ações das grandes empresas sofrerão uma forte queda e isso pode levar a novos desdobramentos sobre o crescimento econômico. E com isso inevitavelmente temos uma interferência negativa na oferta de empregos e além da elevação dos preços das mercadorias. Enfim, a inserção dos jovens em um futuro promissor, ou pelo menos estável, não existe.

Claro, ninguém e em nenhum lugar prometeu o paraíso para os jovens. Todos estão cientes dos problemas que temos. Porém, não falamos tudo para os jovens. O futuro deles pode ser um desastre. Terão guerras, recessão, problemas ambientais e vão conviver com um crescimento dos discursos de ódio (como sempre acontece quando os países enfrentam crises econômicas). Para onde fugir? Ouso dizer que a saída não é fugir (mesmo para os jovens russos ou ucranianos). Todos precisam participar mais da vida social de seus países. Se fugirem, os dirigentes de sempre tomarão os rumos e decidirão a vida dos países sem os jovens. Portanto, cabe a todos nós encontrar meios de ampliar a participação dos jovens nos debates nacionais, em especial, para que eles tenham plena consciência dos desafios que têm pela frente e que não soubemos resolver como, por exemplo, a crise ambiental.

Dijaci David de Oliveira é doutor em Sociologia e Professor da Universidade Federal de Goiás (UFG). Faz o pós-doutorado em sociologia no ICSTE-IUL, Lisboa