Advogada argelina denuncia crimes de Israel
Louisa Hanoune
Louisa Hanoune, é uma advogada que combateu com êxito pela revisão do opressivo “Código de família”. Luta pelos direitos das mulheres e da língua tamazigh, pela soberania nacional e pelos direitos dos trabalhadores. Foi presa política três vezes, recebendo uma corajosa carta solidária de Lula, desde a sua cela, na Polícia Federal em Curitiba. Sua libertação em 2019, após um ano e meio de detenção, foi produto de uma larga campanha internacional e protestos e pedidos de soltura, assumida no país, entre outros, pelo DAP. Louisa é co-presidente do Comitê Internacional de Ligação e Intercâmbio, do qual o DAP é aderente no Brasil. Louisa foi a primeira candidata à presidente da República no mundo árabe, em 2004, e já foi eleita deputada pelo PT. Com seu estilo franco, a secretária-geral do PT falou longamente sobre a situação em Gaza, onde se realiza uma limpeza étnica com a cumplicidade do Ocidente. Louisa Hanoune não poupa a Liga Árabe que perdeu sua credibilidade e sua razão de ser, a traição de certos países árabes e a propaganda midiática, inteiramente a serviço da entidade sionista.
L’Expression: A agressão sionista atingiu proporções desumanas. Desde o início dos bombardeios indiscriminados do exército sionista sobre Gaza, o seu partido denunciou com veemência a grave situação vivida pelo povo palestino. Até onde irá essa limpeza étnica?
Louisa Hanoune: Como você sabe, a questão palestina não é uma questão de solidariedade para a nação, o povo e o Estado argelino. Ela faz parte do nosso DNA. É uma questão central, uma componente da questão nacional, pois a libertação da Palestina é uma condição para a plena emancipação de todos os povos da região da dominação imperialista. E a nossa posição não é ditada por considerações étnicas, linguísticas ou religiosas. É ditada por princípios relacionados à luta dos povos pela emancipação do jugo da opressão colonial.Sim, a entidade sionista despojou o povo palestino da sua terra, usando as piores atrocidades nazistas, com o apoio político e militar do imperialismo estadunidense, o apoio de seus substitutos europeus e a cumplicidade de vários regimes árabes no Oriente Médio e no Magreb (Mauritânia, Marrocos, Argélia, Tunísia e Líbia – NdE). A limpeza étnica e a deportação das populações são crimes contra a humanidade assumidos pela entidade sionista, tal como o objetivo de recolonizar Gaza e o conjunto dos territórios palestinos, o que mostra que a solução de “dois Estados” é uma miragem, uma ilusão, pura farsa. Aliás, o nazi criminoso, Netanyahu, que não cessa de proclamar em alto e bom som que nunca haverá um Estado palestino na Palestina, publicou um mapa no qual não só a Palestina não existe, mas o futuro Israel se estende sobre os territórios de outros países da região, e explicou que é o Novo Oriente Médio. Esse projeto foi anunciado por Condoleeza Rice em 2006 (secretária de Estado dos EUA), quando da agressão ao Líbano. E este mapa foi publicado no site do exército dos EUA. Além disso, como argelinos que recusamos qualquer divisão do país durante a guerra de libertação (1954-1962, 1 milhão de mortos – NdE), que não cedemos nem um centímetro dos territórios, não podemos propor a um povo que se contente com uma pequena parte da sua terra, que abandone os seus direitos históricos, incluindo o direito ao retorno dos refugiados às suas aldeias, às suas casas, das quais todos guardaram a chave. O povo palestino recusa-se a ser confinado em bantustões, portanto, a limpeza étnica pelo genocídio e a deportação do povo palestino só terá fim com o desaparecimento do sistema sionista de apartheid, e centenas de milhões de homens e mulheres que amam a justiça e a liberdade, incluindo os judeus que se manifestam contra o extermínio das populações palestinas em Gaza, colocando-se como a única saída para o restabelecimento da paz na Palestina e na região. Recusaram-se a normalizar as relações com a entidade sionista, o nosso país, a Tunísia, o Iraque, a Síria, a Líbia, a resistência iemenita e o Líbano. Todos os outros regimes árabes são cúmplices
Na última reunião realizada em Riad, os governos árabes expuseram as suas divergências, impedindo uma iniciativa comum. Uma confissão de impotência da Liga Árabe. Devemos ainda acreditar nesta organização ou é apenas uma sombra de si mesma?
Felizmente, nem todos os regimes árabes têm a mesma posição, ainda existe um eixo de resistência constituído por países que se recusaram a normalizar as relações com a entidade sionista, nomeadamente o nosso país, a Tunísia, o Iraque, a Síria, a Líbia, a resistência iemenita e o Líbano. Todos os outros regimes, nomeadamente os Emirados Árabes Unidos, o Bahrein, os dois sudaneses, Marrocos e, ainda antes deles, o Egito e a Jordânia, normalizaram relações com a entidade sionista e são todos cúmplices do genocídio em curso em Gaza e na Cisjordânia, enquanto a Arábia Saudita estava prestes a concluir os acordos de normalização antes de 7 de outubro. É por isso que até as crianças palestinas os consideram culpados e responsáveis pela sua tragédia. Há anos vemos que as cúpulas da Liga Árabe, por terem se tornado um antro dos regimes árabes traidores, conduzem a um nivelamento por baixo das posições dos Estados que resistem, sob o pretexto de preservar a “unidade árabe”. Recorde-se que, para além de venderem a causa palestina, os regimes árabes submetidos, não hesitaram em entrar em guerra contra países “irmãos”, como o Iraque, a Síria e o Iêmen, a mando do imperialismo estadunidense. E, desde 7 de outubro, são os regimes saudita, egípcio e jordaniano que interceptam os mísseis que a resistência iemenita lança sobre a entidade sionista. Os regimes egípcio e jordaniano reprimem os manifestantes que tentam abrir as passagens de fronteira com Gaza e a Cisjordânia, para aliviar o cerco que estrangula as populações palestinas e vir em seu socorro. De nossa parte, afirmamos que esta Liga se tornou um perigo para todos os povos da região. O nosso país não pode ser cúmplice dos regimes serviçais do imperialismo e da entidade sionista. Temos de nos retirar desta entidade, a única no mundo que se define com base num critério étnico e não geográfico. Além disso, somos um povo Amazig (berberes, “homens livres” na língua tamazigh – NdE), parcialmente arabizado pelo advento do Islã, assim como todos os povos do Magreb. É certo que pertencemos ao espaço cultural árabe-muçulmano, mas temos a nossa própria identidade, o que nunca nos impediu de sermos solidários com os povos da região e de defendermos os direitos históricos do povo palestino.
É uma expressão violenta da decomposição do sistema capitalista, cujas únicas respostas são a barbárie, o terror e a mentira”
Que sentido dá a esta campanha política e midiática, esta propaganda assustadora dos meios de comunicação ocidentais?
A grande maioria dos meios de comunicação ocidentais defende as posições dos seus governos, autores de guerra e de barbáries, de forma caricatural e abjeta, sua “independência” é uma utopia. Ao mesmo tempo é uma expressão violenta da decomposição do sistema capitalista, cujas únicas respostas são a barbárie, o terror e a mentira. Mas esses meios de comunicação que pensavam poder enganar todo o planeta falharam miseravelmente e são desprezados pelos povos que se dão conta rapidamente da armadilha. A propaganda midiática, inteiramente ao serviço da entidade sionista e das teses dos seus patrocinadores, as grandes potências imperialistas, não impediu a realização de mobilizações populares e sindicais históricas no Ocidente, algumas delas mesmo apesar de proibidas.
Para aqueles que ainda têm dúvida, não temos aqui a face hedionda de um Ocidente que nos dá “lições” sobre o respeito dos direitos humanos, da democracia e da liberdade?
Em crise, o sistema capitalista, tendo à sua frente o imperialismo dos Estados Unidos e todos os regimes que lhe são subservientes, é como uma fera ferida de morte que mata selvagemente. Esta é a época da aceleração da decomposição deste sistema baseado na opressão e na exploração, que arrasta a humanidade para a barbárie e ameaça mergulhar a civilização humana no caos. As máscaras caíram há décadas, no que diz respeito à democracia e aos direitos do homem que este sistema nos serve, conforme os seus próprios interesses, ou ainda sob as bombas e a devastação provocadas pelas intervenções militares estrangeiras. Os pogroms em Gaza, na Cisjordânia e o apartheid de que são vítimas os palestinos que vivem nas fronteiras de 1948 constituem um golpe fatal para este sistema. Porque a mobilização sem precedentes dos povos em todos os continentes, a começar pelos Estados Unidos e pela Europa, é um ato de acusação, senão um veredito final, contra os governos envolvidos ou cúmplices nesta barbárie.