Cineasta retrata a ‘campanha’ doe ouro para o bem do Brasil
Passado que não passa
Cineasta retrata a ‘campanha’
doe ouro para o bem do Brasil
Chaim Litevski não se rende à amnésia nacional e reabre feridas não cicatrizadas
Renato Dias
Doe ouro para o bem do Brasil. Uma campanha deflagrada em 13 de maio de 1964. Após o golpe de Estado civil e militar. A operação que depôs o presidente da República, João Belchior Marques Goulart. Um nacional-estatista. Em sua versão trabalhista. O herdeiro político de Getúlio Vargas. O Pai dos Pobres. Em 2 de abril. Para arrecadar ouro, dinheiro, cheques, moedas estrangeiras. Com a destinação de mobilizar a população do Brasil. A repetir mantras em defesa da suposta revolução, contra o comunismo, pela tradição, família, livre – mercado e a sua herança cristã. Com a organização dos Diários Associados. Monopólio de mídia. À época.
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Fundado pelo empresário Assis Chateaubriand, o Chatô, o conglomerado de comunicação possuía uma cadeia de TVs, nas capitais, como a Tupi, jornais de suporte impresso, como o Diário da Noite, Correio Braziliense, assim como o Estado de Minas. Rádios, entre elas a Difusora e Tupi. Com a edição diária do programa jornalístico de maior audiência do País. O Repórter Esso. O coordenador da operação era Edmundo Mendes. Do Estado de São Paulo. Milhões de brasileiros entregaram alianças, correntes, pulseiras, brincos, salários, dólares. Até Lincoln Gordon. Mesmo o marechal Humberto Castello Branco. O presidente da República.
Fervor patriótico. De alta voltagem. Sob manipulação do grupo empresarial de Chatô. Um homem sem escrúpulos. Muito menos limites. Com a benção do general do Exército Brasileiro Amaury Kruel. As mulheres obtiveram protagonismos, revela a doutora em História Contemporânea da Universidade Federal Fluminense, Janaína Cordeiro. Tanto nas marchas da Família com Deus e Pela Liberdade, iniciadas em São Paulo, uma demanda da sociedade civil pela intervenção das Forças Armadas para a derrubada do comunismo e da República Sindicalista, quanto na mobilização para a arrecadação de 30 milhões de dólares, em valores atualizados.
Os recursos deveriam ser aplicados no pagamento da dívida externa do Brasil. A novela teve múltiplos capítulos. Ministro da Economia à época do Milagre Econômico, de 15 de março de 1967, a 15 de março de 1974, o economista da USP Delfim Netto diz que o governo federal ficou com uma bomba nas mãos. Uma enxada de ouro foi parar na casa da filha de Humberto Castello Branco. Morto em 1967. Em acidente aéreo suspeito. Narrativas desencontradas marcaram um incomum bate – cabeças na Esplanada dos Ministérios. Em Brasília. A capital da República. Sob a ditadura civil e militar. Um mistério. Qual teria sido o destino do ouro?
Assis Chateaubriand amealhou a sua gorda corretagem. Sem uma auditoria independente. O que significava mais de seis milhões de dólares. Em um leilão, a Caixa Econômica Federal [CEF] beliscou cinco por cento. O ouro para o bem do Brasil saiu de São Paulo, parou em Santos e partiu para o Rio de Janeiro. Ele tramitou na Casa da Moeda, Banco do Brasil, CEF e Banco Central. Um estelionato. Assim definiu uma doadora. Mais de 50 anos depois. É o documentário ‘Golpe de Ouro’. História real contada por Chaim Litewski. Em 80 minutos. Na contracorrente da amnésia nacional. Um passado que não passa. Em diálogo com o ano de 2021.