A ovelha Negra que incomodou a ditadura
De 1964 a 1985

Letras censuradas, shows cancelados, prisão e condenação

Renato Dias

Presa em 24 de agosto de 1976, grávida, aos 28 de idade, por agentes da Delegacia de Investigações [DEIC], sob a acusação de porte de 300 gramas de maconha, em São Paulo, a rainha do rock nacional Rita Lee ficou oito dias na cadeia, foi condenada a um ano de prisão domiciliar e ao pagamento de 50 salários mínimos. O seu advogado era José Carlos Dias. Defensor de presos políticos.

O episódio de sua prisão arbitrária provocou a imediata solidariedade da cantora Elis Regina. A artista já havia sofrido também as dores da perseguição da repressão política, militar e cultural. A ‘pimentinha’ a visitou na penitenciária, com o seu pequeno filho, e chegou até a armar um barraco para exigir tratamento civilizado à ex – vocalista de Os Mutantes. Ela cantaria o Hino da Anistia.

Antes, no mesmo ano, a Divisão de Censura da Polícia Federal [PF] proibiu um show da Ovelha Negra, no Colégio Marista, em Brasília [DF], a capital da República. Tempos sombrios aqueles. Um golpe de Estado civil e militar no Brasil em 1964 depôs o então presidente da República João Belchior Marques Goulart e instalou um Estado de Exceção. Noite que durou exatos 21 anos.

Uma artista contra o stablishment. É citada em até 250 documentos da ditadura civil e militar no Brasil. Já em 1969 um informe confidencial requer os seus antecedentes. Rebelde, perigosa, hippie, incitadora à rebelião popular. Uma mulher contrária à família e aos bons costumes. No ano de 1980, a cantora que morreu em 8 de maio de 2023 teve o LP Lança Perfume proibido.

O Departamento de Censura da Polícia Federal, uma herança do DIP, da fase ditatorial de Getúlio Vargas, que suicidou – se em 24 de agosto de 1954, vetou As duas faces de Eva, Banho de Espuma, Ainda bem que eu não desisto, Arrombando a Festa. Assim como Gente Fina, de 1973. Anos de chumbo e de ouro. Nem barriga de mamãe escapou da guilhotina da PF, em 1981.

Rita Lee enviou a letra Arrombou o Cofre, em época de escândalos de corrupção na Esplanada dos Ministérios, ainda em 1983, sob o eufemismo de Arrombou a Festa. Veja o parecer do DPF, Área de Censura. A letra apresenta um contexto crítico que denigre imagens de nossas autoridades vigentes, aponta, em tom de indignação, o censor, nos estertores da ditadura civil e militar.

Novo censor registra que “a composição contém críticas políticas que descambam para o insulto à personalidades políticas como as excelências dos deputados federais Ivete Vargas, Paulo Maluf, além dos ministros Hélio Beltrão, Mario Andreazza, Delfim Netto, Golbery do Couto e Silva, o vice – presidente da República Aureliano Chaves”. Vetado: Papai me empresta o carro.

O texto acima que relata as perseguições da ditadura civil e militar, à Rainha do Rock nacional, Rita Lee, morta dia 8 de maio de 2023, dedico-o aos meus amigos, amigas, companheiros de jornadas ao longo da história dos séculos 20 e 21, pela rebeldia, desobediência civil, irreverência, à luta contra a ditadura civil e militar. Mais: pela construção da UMES, UBES, PT, CUT, IV Internacional. Às ideias de Karl Marx, Leon Trotski, Antonio Gramsci, Eric Hobsbawn. Integram a lista Paulo Anderson Quirino Garcia [Galinha], Altino Barros, Rogério Oliveira Diniz, Clayton de Souza Avelar, Evando Aureliano Peixoto, Marcus Vinícius de Faria Felipe, Sebastião Teatinni, Déo Melgaço, Júlio Turra, Markus Sokol, Francisco Kleber Paulo Paes Landim, Márcio Paes Landim, Bruno Benfica, Marcelo Benfica, Marta Bastos, Lúcio Malagoni, João Júnior [Cirurjoão]. Ao historiador Daniel Aarão Reis Filho. Para Abrão Amisy, Jales Guedes, Deusdeth Carnot. A Jardel Sebba, Sebastião Peixoto, Rosemar Cardoso Maciel, Erotides Borges, Fausto Jaime, Pedro Wilson, Virgílio Alencar Santana, Djaci de Oliveira, Itamar Correia, Itamar Borges, Luciana Rocha da Costa, Maristela Costa Negraes, Ana Isabel Lopes Mendonça, Lucas Pinheiro, Augusto César de Almeida, Hercília Alves da Silva, Cleici Vecci, Frederico Vitor de Oliveira, Flávia Almeida [SP], Laura Almeida, Celso Riva, Míriam Helena, Geraldinho César de Almeida, Bruno Santos Martellos. Aos meus irmãos Waldomiro Batista, Silvino Dias, Ricardo Dias, Honorina Dias, Beth Dias, Martha Dias. Ao desaparecido político Marcos Antônio Dias Batista. Ao velho primo: José Paulo de Morais. À minha família: Meirilane Dias, Juliana Dias, Guarani Neto, Daniel Dias, Maria Rosa Dias. Pets: Geleia Dias, Dalila Dias, Porquinho Dias. Tutuquinho Dias [In memorian]. Ao meu novo irmão Gustavo Alves de Oliveira [Lola]. Ao Vila Nova Futebol Clube, a maior paixão do Centro-Oeste. Rita Lee, sempre presente!
