A sinceridade macabra de Mourão
A sinceridade macabra de Mourão

“Apurar o quê?
Francisco Celso Calmon
“Os caras já morreram tudo, pô. Vai trazer os caras do túmulo de volta?” Declara e ri, como a caveira estereótipo da morte e o sorriso macabro dos que não acalentam empatia pelo outro, diante dos áudios do STM, comprovadores das bárbaras torturas e sevícias dos agentes estatais durante a ditadura militar. Como alguém chega a general e a vice-presidente da República sendo tão apedeuta?

Será que ele não sabe que o passado impune mantém a impunidade em cadeia? Será que ele não sabe que a história é a grande mestra da cidadania de um país? E quando falseada deforma os valores de uma nação? Será que não alcança dois milímetros a mais de visão para entender que a mentira não deve ser alicerce da história de um povo? Quando acrescenta em suas idiossincrasias que voltar ao passado é também chegar à ditadura de Vargas, ele comete a sinceridade, porque reconhece, implicitamente, que o que eles, os milicos, chamam de movimento militar foi na verdade uma ditadura. Seu sincericídio obstruiu o seu raciocínio, porque não há censura e nem impedimento a reconhecer as arbitrariedades da ditadura Vargas, mas os há em relação a ditadura militar, pois as Forças Armadas teimam e resistem em reconhecer a sua responsabilidade histórica dos graves delitos cometidos contra aos opositores daquela cruenta ditadura.

“Dois lados”, general, pode ter a sua ignorância, porque o Estado não pode ter lado, não pode ter licença para cometer crimes de lesa-humanidade, como o sequestro, a tortura. O Estado não pode ser um fora-da-lei que disponibiliza o seu poder, o monopólio da força, para enfrentar os opositores de um governo ditatorial. E o Estado, Mourão, age através de seus agentes, e esses agentes, mesmo pós mortem, devem ser responsabilizados para servir de exemplo, para não voltar a acontecer. Enquanto não houver cabal apuração, criminalização dos responsáveis e reparação aos atingidos, as fardas estarão manchadas com o vinho tinto do sangue coagulado dos brasileiros torturados e assassinados pelas três armas. Não tenha medo de defuntos, tenha medos das almas penadas dos seus colegas que praticaram as graves violações dos direitos humanos e ficaram impunes. Não será com chula ironia e deboche macambúzio que o passado deixará de assombrar o mundo dos vivos, especialmente àqueles que são cúmplices idelogicamente daquelas barbaridades. O passado os condena a pedir perdão à nação brasileira!

Francisco Celso Calmon, perseguido, sequestrado, prisioneiro, torturado juntamente com mãe de seus filhos, que fora ameaçada de ser jogada aos jacarés mantidos pelo coronel Paulo Malhães na PE da Tijuca no Rio, e mãe e irmãos humilhados, pela ditadura militar. Ex-coordenador da Rede Brasil – Memória, Verdade e Justiça e coordenador do canal pororoca.
