Marcio Pochmann
Economia

Distribuição da renda no Brasil

A imagem da fome

Distribuição da renda no Brasil

Análise sobre quem ganhou com o aumento mínimo da renda nacional nos últimos 30 anos. Nos governos do PT, parte do crescimento do PIB, 45,5%, favoreceu trabalhadores. No pós-golpe, país andou para trás e não lhes sobrou quase nada

Marcio Pochmann

Outras Palavras

As primeiras duas décadas do século 21 são ilustrativas da experimentação de distintos padrões macroeconômicos de distribuição primária da renda nacional no Brasil. Como padrão distributivo se toma em referência os três principais parâmetros macroeconômicos. Mais precisamente, o quanto o governo, os capitalistas e os trabalhadores capturam através de suas específicas formas o adicional de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB). Respectivamente, a arrecadação tributária (imposto, taxa e contribuição) pelo governo, a receita dos proprietários (lucro, aluguel, juro, renda da terra, dividendo) pelos capitalistas e o rendimento dos não proprietários (salário, remuneração, ordenados) pelos trabalhadores.

Para facilitar o entendimento, adota-se como parâmetro macroeconômico de distribuição primária da renda, as experiências dos mandatos presidenciais denominadas por Neoliberal (1994-2002), Trabalhista (2003-2015) e Ultraliberal (pós-2015). Os padrões distributivos Neoliberal e Ultraliberal podem ser diferenciados pela intensidade com que favorecem tanto a arrecadação tributária do governo como a receita dos proprietários capturada pelos capitalistas.

Fernando Henrique Cardoso

O padrão distributivo Trabalhista revela a ênfase no rendimento dos não proprietários absorvido pelos trabalhadores, sem deixar de favorecer os ganhos dos capitalistas e em menor grau o governo. Para efeito demonstrativo, três distintos períodos de tempo (2001-02; 2013-14; e 2020-21) foram selecionados visando revelar os distintos padrões macroeconômicos de distribuição do adicional do PIB contabilizado pelo IBGE.

Luiz Inácio Lula da Silva em dois momentos históricos

Pela experiência Neoliberal, por exemplo, o governo absorveu 37% do adicional do PIB ocorrido em 2002, seguido pelos capitalistas que capturaram 33,7% e os trabalhadores 29,3%. Nessa hierarquia de posições, o padrão de distribuição primária da renda explicitou que o governo recebeu 26% a mais que o conjunto dos trabalhadores, enquanto a totalidade dos capitalistas capturaram 13% a mais do adicional do PIB que a soma de todos os rendimentos dos não proprietários.

Alvorada _ Dilma Rousseff

Na experiência Trabalhista, os trabalhadores absorveram 45,5% do adicional do PIB em 2014, acompanhados por 30,1% dos capitalistas e de 24,4% do governo. Como se pode perceber, a hierarquia do padrão macroeconômico distributivo se apresentou muito distinta da verificada anteriormente (Neoliberal). O conjunto dos trabalhadores brasileiros conseguiu capturar mais de 51% do adicional do PIB que o total das receitas apropriadas pelos proprietários referente ao adicional do PIB. Em relação ao total da arrecadação tributária do governo, a soma dos rendimentos dos não proprietários foi 86% superior.

Paulo Guedes

Por fim, a experiência Ultraliberal que resultou em padrão macroeconômico de distribuição do adicional do PIB completamente distinto dos dois anteriores (Neoliberal e Trabalhista). Percebe-se, por exemplo, que no adicional do PIB do ano de 2021, o governo capturou 50,2% do adicional do PIB, os capitalistas absorveram 49,3% e os trabalhadores apenas 0,5%. Somente o governo e os capitalistas receberam 99,5% do acrescimento do PIB do ano 2021. Por essa hierarquia de posições, entre os três principais parâmetros macroeconômicos no Brasil, o governo arrecadou 100,4 vezes mais que o conjunto dos trabalhadores, enquanto os capitalistas capturaram do adicional do PIB 98,6 vezes mais que o total dos rendimentos auferidos pelos não proprietários.

A crise: o desemprego

A pluralidade de padrões macroeconômicos de distribuição da renda durante o primeiro quinto do século 21 revela visões próprias de sociedade e projeto de país. Interessante notar que tanto no Neoliberalismo como no Ultraliberalismo, o Estado se apresentou como o privilegiado na repartição primária do adicional da renda nacional. Da mesma forma, os mesmos dois padrões distributivos colocaram os trabalhadores como desfavorecidos. O Ultraliberal é mais extremado que o Neoliberal, sendo o Estado o mais beneficiado, e os trabalhadores os mais lesados.

Friedrich Hayek
Friedrich Hayek, ultraliberal

No caso dos capitalistas, os dois padrões macroeconômicos (Neoliberal e Ultraliberal) os mantiveram na segunda posição hierárquica da repartição primária do adicional do PIB. Mas foi no Ultraliberal que os capitalistas estiveram mais próximos dos excelentes ganhos apropriados pelo governo. Pelo padrão Trabalhista, os capitalistas também ocuparam a segunda posição na hierarquia distributiva, porém foram os trabalhadores os mais beneficiados. O governo, pelo contrário, foi o menos favorecido.

Karl Marx e Friedrich Engels
Karl Marx e Friedrich Engels

 

Renato Dias

Renato Dias, 56 anos, é graduado em Jornalismo, formado em Ciências Sociais, com pós-graduação em Políticas Públicas, mestre em Direito e Relações Internacionais, ex-aluno extraordinário do Doutorado em Psicologia Social, estudante do Curso de Psicanálise do Centro de Estudos Psicanalíticos do Estado de Goiás, ministrado pelo médico psiquiatra e psicanalista Daniel Emídio de Souza. É autor de 22 livros-reportagem, oito documentários, ganhou 25 prêmios e é torcedor apaixonado do maior do Centro-Oeste, o Vila Nova Futebol Clube. Casado com Meirilane Dias, é pai de Juliana Dias, jornalista; Daniel Dias, economista; e Maria Rosa Dias, estudante antifascista, socialista e trotskista. Com três pets: Porquinho [Bull Dog Francês], Dalila [Basset Hound] e Geleia [Basset Hound]. Além do eterno gato Tutuquinho, que virou estrela.

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