Gestantes, lei e trabalho presencial
A lei que afastava as gestantes do trabalho presencial mudou: hoje, abril de 2022, já é o momento de retornar ao seu local de trabalho?
Lucas Gomes de Araújo
Especial
Nesta leitura, você afastará dúvidas que possam ter surgido após a Lei federal n. 14.311/2022 ter entrado em vigor, com veto, e alterado algumas disposições normativas contidas na Lei federal n. 14.151/2021. O assunto interessa especialmente às mulheres, especificamente àquelas que estão gestantes e empregadas.
Neste contexto, enquadram-se as domésticas também. Durante a pandemia decorrente do coronavírus SARS-coV-2 houve a promulgação da Lei n. 14.151/2021. Ela determinava o seguinte em seu artigo 1º, caput, “durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração”.
Contudo, a lei anteriormente citada determinava que a empregada afastada deveria ficar à disposição do empregador para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância. Agora, o que causa insegurança nas especiais destinatárias dessa lei são as alterações promovidas pela Lei nº 14.311/2022. Afinal, surgiram três hipóteses não cumulativas que condicionam a empregada gestante a retornar à atividade presencial, exceto se o empregador optar por mantê-la no famoso “home office”.
O empregador, se quiser, ainda poderá mantê-la em “home office”
Lucas Gomes de Araújo
Então, aqui vai uma dose de tranquilizante para você: o empregador, se quiser, ainda poderá mantê-la em “home office”. Neste ponto, a ressalva que faço é a seguinte: para alterar temporariamente sua função, sem prejuízo de sua remuneração integral e garantida a retomada da função anteriormente exercida, quando retornar ao trabalho presencial, o empregador precisará respeitar suas competências para o trabalho pretendido, assim como as suas condições pessoais.
O estado de calamidade vigorou somente durante o ano de 2020
Lucas Gomes de Araújo
Agora, quero abordar brevemente cada uma das hipóteses trazidas pela Lei n. 14.311/2022 e que, caso sejam concretizadas, acarretarão no seu retorno às atividades presenciais. Portanto, peço que tenha bastante atenção a partir de agora. Eis a primeira hipótese em que a empregada gestante, inclusive a doméstica, deverá retornar às atividades presenciais “após o encerramento do estado de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do coronavírus SARS-coV-2”. Nesse momento, quero chamar a atenção para o seguinte: estado de calamidade não se confunde com estado de emergência. O estado de calamidade vigorou somente durante o ano de 2020, em razão do decreto legislativo n. 06.
O estado de emergência, por sua vez, ainda persiste
Lucas Gomes de Araújo
O estado de emergência, por sua vez, ainda persiste, tendo em vista que o artigo 1º, § 2º, da Lei n. 13.979/2020 dispõe que “Ato do Ministro de Estado da saúde disporá sobre a duração da situação de emergência de saúde pública de que trata esta Lei”. Então, deixe-me contar uma coisa para você, até o momento esse ato não foi editado. Logo, o estado de emergência ainda não se encerrou. A meu ver, a empregada gestante ainda não pode retornar ao trabalho presencial com base na primeira hipótese.
Pouco importa esquema vacinal apresentado pela bula do fabricante das vacinas
Lucas Gomes de Araújo
Eis a segunda hipótese em que a empregada gestante, inclusive a doméstica, deverá retornar às atividades presenciais “após sua vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2, a partir do dia em que o Ministério da Saúde considerar completada a imunização”. Afinal, o que é imunização completa? Consoante o texto da segunda hipótese, quem decide isso é o Ministério da Saúde. Logo, pouco importa o esquema vacinal apresentado pela bula do fabricante das vacinas.
De acordo com a bula dos fabricantes das vacinas da Coronavac, Astrazeneca e Pfizer, duas doses completam o ciclo vacinal e, por conseguinte, a imunização. A vacina da Janssen, por seu turno, atinge esse fim apenas com a dose única. Contudo, conforme dito antes, a palavra final virá do Ministério da Saúde. De acordo com o plano de operacionalização da vacinação contra a Covid-19, 12ª edição, 01/02/2022 e com a Nota Técnica MS n. 11/2022, o ciclo vacinal será completo:
Vacina
Esquema vacinal completo pelo MS
NOTA TÉCNICA N. 11/2022- SECOVID/GAB/SECOVID/MS
Coronavac
Dose 1+ dose 2 + reforço
Astrazeneca
Dose 1+ dose 2 + reforço
Pfizer
Dose 1+ dose 2 + reforço
Janssen
Dose única de Janssen + reforço
Esse esquema apresenta as informações mais atuais acerca do que seria considerado esquema vacinal completo. Nesse ponto, reitero que a definição de imunização completa é vinculada ao ato do Ministério da Saúde, não à bula do fabricante das citadas vacinas.
A definição de imunização completa é vinculada ao ato do Ministério da Saúde
Lucas Gomes de Araújo
Eis a terceira hipótese em que a empregada gestante, inclusive a doméstica, deverá retornar às atividades presenciais “mediante o exercício de legítima opção individual pela não vacinação contra o coronavírus SARS-CoV-2 que lhe tiver sido disponibilizada, conforme o calendário divulgado pela autoridade de saúde e mediante o termo de responsabilidade de que trata o § 6º deste artigo”. O referido parágrafo assinala que a empregada gestante deverá assinar termo de responsabilidade e de livre consentimento para exercício do trabalho presencial, comprometendo-se a cumprir todas as medidas preventivas adotadas pelo empregador.
A Lei n. 14.151/2022 ainda assinala que o exercício da opção pela não vacinação é uma expressão do direito fundamental da liberdade de autodeterminação individual, e não poderá ser imposta à gestante que fizer a escolha pela não vacinação qualquer restrição de direitos em razão dela. Particularmente, acredito que a terceira hipótese é a mais polêmica e temerária. Afinal, várias podem ser as razões que influenciaram na decisão da empregada gestante em não se vacinar, por exemplo, motivação pessoal ou recomendação médica.
As variáveis situacionais que podem advir da terceira hipótese são incontáveis, de modo que cada contexto ensejará uma variedade de reflexos jurídicos sensíveis não apenas às empregadas gestantes, mas também aos empregadores. Portanto, recomenda-se que você “mamãe” se consulte com seu médico durante toda a sua gestação, mas, caso tenha decidido não se vacinar, seja por qualquer motivo, e precise voltar ao trabalho presencial, se consulte com um advogado. Afinal, a integridade física e emocional sua e do seu bebê são extremamente valiosas.
Lucas Gomes de Araújo, Advogado e Pós-graduado em Direito do Trabalho, e-mail: araujogms.advocacia@gmail.com
Lucas Gomes de Araújo, advogado especialista em Direito do Trabalho