Revogar a Reforma Trabalhista
Revogar a Reforma Trabalhista
Julio Turra
Os primeiros dias deste ano foram marcados pela fala de Lula que sugeriu sua disposição de revogar a reforma trabalhista adotada no governo Temer em 2017, ao citar o ocorrido na Espanha, no final de 2021, por iniciativa do governo de Pedro Sánchez (PSOE e Podemos). Foi o suficiente para gente como Rodrigo Maia, Dória, Moro e o próprio Temer, saírem em defesa da dita reforma, na verdade um ataque brutal aos direitos trabalhistas e à ação sindical aprovado pela maioria reacionária do Congresso, que em nome da “geração de empregos” – promessa jamais cumprida – precarizou ainda mais as relações de trabalho no Brasil, em benefício exclusivo dos empresários.

O que de fato ocorreu na Espanha?
Em 6 de janeiro publicamos neste site a declaração do POSI (seção da 4ª Internacional no Estado Espanhol) à qual remetemos o nosso leitor. Ela explica o conteúdo do acordo tripartite – governo, empresários e duas centrais sindicais (CCOO e UGT) – que modifica alguns elementos da reforma trabalhista feita no governo Rajoy (PP, direita) em 2012, mas que não mexe na reforma anterior, feita no governo Zapatero (PSOE), contra a qual os sindicatos fizeram uma greve geral em setembro de 2010. A imprensa no Brasil limitou-se a comentar a fala de Lula e suas repercussões, sem detalhar o que se passou na Espanha. Exceção feita à Carta Capital, que publicou em seu site (07/01) o artigo “Citada por Lula, revisão de reforma trabalhista divide a esquerda na Espanha; entenda a discussão”, cujo subtítulo indica que: “Políticos espanhóis acusam o governo Sánchez de ter cedido aos empresários e à União Europeia ao manter itens da reforma de 2012”.

Com efeito, a União Européia, para liberar verbas do fundo “Next Generation” para a Espanha, exigia de seu governo que qualquer mudança de regra trabalhista teria que se dar antes de 31 de dezembro, daí a pressa para se chegar a um acordo. Quanto aos empresários, as suas entidades CEOE e Cepyma consideram em nota conjunta que “o acordo consolida o modelo laboral atual, que permitiu aumentar a produtividade das empresas, assegurar sua competitividade e contribuir ao crescimento do emprego. (…) mantém intactos os mecanismos de flexibilidade interna que garantem a adaptação das empresas às circunstâncias, assegura a liberdade de empresa e a segurança jurídica, contribuindo para a Paz Social.” O jornal “El País”, em editorial, afirmou que o acordo “contribui para eliminar a temporalidade abusiva, assentar a paz social, assegurar a estabilidade política e garantir o acesso aos fundos europeus”. Já o “ABC”, jornal monarquista, diz que é “um acordo que modificará alguns aspectos do que foi aprovado em 2012, mas que mantém a sua essência. Em nenhum caso se trata da ‘revogação’ que textualmente prometeram o PSOE e Podemos em seu programa eleitoral e em seu pacto de coalizão.”

Assim, os grandes entusiastas do acordo são dirigentes da UGT e CCOO que falam em “acordo histórico” e “mudança de ciclo”, seguidos por partidos (como o PCE) que apoiam o governo. Há alguns que dizem que o acordo é um passo inicial, depois virá a revogação de outros aspectos. Mas Yolanda Díaz, ministra do Trabalho que arquitetou o acordo, deixou claro que não haverá mais reformas laborais nesta legislatura. Em suma, o acordo pressupõe que, por meio do “diálogo social”, governo e sindicatos aceitam não mexer na grande maioria dos cortes de direitos incluídos nas reformas laborais de Zapatero e Rajoy. Fica claro que o compromisso eleitoral do PSOE e Podemos de revogar a reforma trabalhista não foi cumprido. Entretanto, a exigência de revogação completa das reformas de 2010 e 2012 segue sendo um objetivo do qual não renunciam outras centrais sindicais da Espanha e inclusive sindicalistas das bases de Comisiones Obreras (CCOO) e UGT.

De volta ao Brasil
É oportuno que neste ano eleitoral, mesmo que ainda faltem nove meses para as eleições e seria melhor nos livrarmos do governo Bolsonaro desde já, a questão da revogação da reforma trabalhista tenha vindo à tona pela voz de Lula. Em 11 de janeiro houve uma reunião virtual entre representantes do governo da Espanha, da UGT e de CCOO com Lula e dirigentes de centrais sindicais do Brasil. Segundo alguns dos participantes, a maior parte do tempo foi tomada pelo ministro espanhol Escrivá que, munido de um “power-point”, destacou os feitos do governo PSOE-Podemos. Ele destacou que a revisão da reforma laboral contou com “amplo consenso construído pelo governo com a sociedade civil, sindicatos e empresários”. Já Lula não teria falado de revogação da reforma trabalhista, mas apenas de garantir direitos aos trabalhadores de aplicativos e na construção de uma mesa de negociação para o debate tripartite.

De todo modo a questão está colocada. O período iniciado com o golpe contra Dilma e que desaguou no atual governo foi de destruição de direitos e conquistas dos trabalhadores e do povo, de entrega da nação aos apetites das multinacionais, de desmanche dos serviços públicos. O que exige um programa de reconstrução da nação, sobre a base dos interesses do povo trabalhador e não da elite sanguessuga subordinada ao imperialismo, que seja abraçado pela candidatura de Lula. Tal programa, é claro, deve incluir a revogação da reforma trabalhista de 2017 e seus anexos, bem como da reforma da Previdência de Bolsonaro, para ficar em dois exemplos. Como vimos acima, não é seguindo o “modelito espanhol” que avançaremos nessa via necessária.
