Silvio Costa
Política

Uma noite que ‘durou’ 72 dias

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Túnel do tempo

Uma noite que

‘durou’ 72 dias

Doutor em sociologia, o marxista Sílvio Costa analisa, 150 anos depois, ecos da Comuna de Paris, insurreição proletária que toma o poder em Paris, a capital mais charmosa da Europa

Podcast Silvio Costa

 

 

 

Renato Dias

De 18 de março a 28 de maio, Ano de 1871. Apenas 72 dias. A primeira experiência de uma insurreição e de constituição de um governo de linhagem e programa proletários. Da História da humanidade. O significado é além do calendário. Temporal. É o encerramento da Era das revoluções burguesas. Para a entrada em cena das revoluções socialistas. Primeiro, em 26 de outubro ou 7 de novembro de 1917, na Rússia. A segunda, na China, em 1949. A terceira, em primeiro de janeiro de 1959, em ‘Nuestra América’, Cuba. É um dever fundamental e um direito lutar pelos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, desfraldadas pela Revolução Francesa, em 1789, avalia o doutor em Sociologia da Pontifícia Universidade Católica de Goiás [PUC-GO], Silvio Costa. O autor inicia projeto catarse de captação, em financiamento coletivo, para o lançamento da terceira edição revista e ampliada de ‘Comuna de Paris. O proletariado toma o céu de assalto’.

O que foi a Comuna de Paris?

Silvio Costa _ Há 150 anos, o proletariado de Paris se insurge. Contra as duras condições de sobrevivência imposta aos trabalhadores e a capitulação do governo fantoche francês frente às imposições das tropas prussianas que cercavam a capital. A insurreição passou à História como: a Comuna de Paris. No ano de 1871. A primeira experiência de um governo proletário da humanidade. O tempo cronológico, de 18 de março a 28 de maio, da Comuna de Paris de 1871, é muito curto, apenas setenta e dois dias. Com um inestimável significado para aqueles que querem uma sociedade justa, fraterna e igualitária. Ao mesmo tempo, encerra a Era das Revoluções Burguesas. Para anunciar a Era das Revoluções Socialistas, tornada realidade a partir de 1917 com a Revolução Russa, e em 1949, com a Revolução Chinesa. Do ponto de vista teórico, por ser a primeira revolução proletária, ela contribuiu decisivamente a partir de suas experiências econômicas, políticas, sociais e organizativas, para formular a teoria da revolução socialista e do Estado proletário. Apesar de  o Brasil e outros países estarem vivendo tempos estranhos e difíceis, de tentativas de impor a barbárie e regimes fundamentalistas, nazifascistas, podemos afirmar em perspectiva histórica, que essas experiências serão derrotadas. Em curto ou médio espaço de tempo. Após 150 anos, a Comuna de Paris continua atual. O seu estudo e conhecimento, associados aos de outras revoluções, contribuem para desnudar conhecidas e velhas falácias de fim da história, de retorno e vitória das “trevas fundamentalistas”. Ao estudar e conhecer esta experiência os democratas e pessoas progressistas, em particular ao proletariado e assalariados em geral, compreenderão que não só é possível, mas é um dever fundamental e um direito lutar pelos ideais de liberdade, igualdade e fraternidade, desfraldadas pela Revolução Francesa em 1789, mas que infelizmente, não se concretizaram para a maioria da população. Os ideais continuam atuais e estão presentes, em nosso dia a dia,  como anseios e perspectivas, constituindo na seiva que levará, em breve, à construção de uma nova sociedade, justa, fraterna e igualitária. A partir de 18 de março de 1871, em condições extremamente adversas, é iniciado o processo insurreicional em reação às tentativas das tropas militares do governo fantoche francês de desarmar Paris. Imediatamente, é eleito democraticamente, através do sufrágio universal, o governo da Comuna que frente a necessidades impositivas, aprova importantes decisões político-administrativas, configurando assim um novo tipo de organização estatal. Exemplo utilizado por Marx e Engels para configurar o Estado pós-capitalista, socialista. Entre estes decretos, ressaltamos: dissolução do exército regular, substituindo pelo povo em armas organizado na Guarda Nacional Democrática, sendo que os cargos de comando e todos os outros, vinculados às organizações político-administrativas, ocorreriam através de eleições para mandatos imperativos, ou seja, em caso de não corresponder às atividades e tarefas que lhes foram atribuídas poderiam ser demitidos. Um teto salarial para os funcionários do novo Estado, em torno do salário médio de um operário, assim o vencimento mais elevado de um empregado da Comuna, inclusive dos cargos dirigentes, não poderia exceder o teto. Os bens da Igreja foram nacionalizados. É estabelecido o Estado Laico. A separação da Igreja e do Estado, a abolição de todos os pagamentos do Estado para fins religiosos, assim como a transformação de todos os bens eclesiásticos em propriedade nacional e a exclusão das escolas, de todos os símbolos religiosos, imagens, dogmas, orações. Já que a religião não deve ser imposta e financiada pelo dinheiro público. A opção religiosa pertenceria ao âmbito da consciência de ‘cada um’. A democracia proletária passou a ser exercida de forma direta através do Conselho da Comuna. Foram criadas associações operárias em fábricas com o objetivo de assegurar a continuidade da produção.  Ela isentou os pagamentos de juros e rendas e suspendeu as vendas de penhores existentes no montépio municipal. Baseado na consigna de que a ‘bandeira da Comuna é a da República mundial’, permitiu aos estrangeiros eleitos assumissem cargos e funções na Comuna. Decisões que correspondem ao exercício da democracia direta. Indico a leitura de “Comuna de Paris. O proletariado toma o céu de assalto”, em 3ª edição, e a colaborar com o Projeto Catarse de financiamento coletivo para a publicação deste livro e ajudar em sua divulgação.

A História guardou imagens da Comuna de Paris?

Silvio Costa_ Sem dúvida e em diversos sentidos. Pelos ensinamentos de sua experiência. Um acontecimento que encerra a denominada Era das Revoluções burguesas. Ao anunciar a “Era das Revoluções socialistas”. Até mesmo pelo farto e rico material bibliográfico e iconográfico existentes. Além de propiciar o surgimento de organizações políticas que conservam suas memórias e que anualmente realizam atividade de rememoração dos acontecimentos vinculados à Comuna de Paris. Entre estas, assume destaque uma que foi fundada em 1888, Les Amis de la Commune, que possui farto e rico material aberto a consulta dos interessados, bastando ir a este endereço eletrônico: https://www.commune1871.org/

Quem eram os communards?

Silvio Costa – Communards é uma palavra, ou seja, um conceito francês, atribuído a aqueles/aquelas que ousaram rebelar-se contra a opressão, a dominação de classes, às duras condições de sobrevivência impostas à maioria da população e à entrega da França à ocupação pelas tropas prussianas, vencedoras da guerra franco-prussiana. Em tradução livre, são os comuneiros. Porém, esta tradução usual, não é conveniente, pois empobrece o real significado da palavra francesa. Podemos sinteticamente dizer que são aqueles/aquelas que se identificam com o bem comum, com uma vida solidária e fraterna, orientada por princípios igualitários. Para melhor entendimento de seu significado, hoje, podemos estabelecer um paralelo com a palavra portuguesa ser de “esquerda”, socialistas, comunistas. Àqueles que almejam e lutam por um mundo mais justo, fraterno e igualitário. Aproveitando a oportunidade, gostaria de destacar a importância e o papel fundamental desempenhado pelas mulheres nesta atroz experiência que demonstrou as atrocidades às quais são capazes as classes dominantes e exploradoras para manter seus privilégios. Mas, ao mesmo tempo, mesmo sendo regada com o sangue dos/das Communards, é uma demonstração de heroísmo e é um exemplo brilhante sobre a disposição dos explorados e oprimidos em lutar para a eliminação da sociedade de classes, da exploração e opressão.

Qual a análise de Karl Marx [1818-1883] da Comuna de Paris?

Silvio Costa_ Marx e Engels, dedicados e argutos pesquisadores e estudiosos em diversas áreas do conhecimento, acompanharam de perto os acontecimentos europeus, a derrota da França na guerra franco-prussiana e analisaram suas consequências para a Europa e em particular para a França. Sobre estes acontecimentos indico-lhes duas obras fenomenais que são inclusive importante auxiliares para entender o Brasil hoje. A primeira é o “Dezoito Brumário de Luís Bonaparte” e a segunda é o informe redigido por Marx para a Internacional, publicado sob o título de “Guerra civil na França”. Marx, ao analisar o desenrolar em consequência da derrota francesa na guerra franco-prussiana, a instabilidade política e o vazio de poder, alerta que dificilmente uma insurreição proletária obteria sucesso, pois se encontrava frágil e carente de uma organização unitária capaz de conduzir o processo revolucionário à frente, ao mesmo tempo teria grande dificuldade para combater o grande poderio militar destrutivo sob o controle do governo Thiers, em aliança e apoiado pelas tropas prussianas que ocupavam grande parte do território francês e sitiavam Paris. É uma análise premonitória que antecedeu o deflagrar da insurreição em 18 de março. É quando escreve a famosa frase “O proletariado tentou tomar o céu de assalto”. Mas desencadeada a insurreição dedicou-se de “corpo e alma” para apoiá-la e após sua liquidação, debruçou-se a analisá-la e extrair seus ensinamentos. Concluído daí que a possibilidade de destruição do Estado burguês  e organização de um novo tipo de Estado, é uma realidade, não uma retórica.

Qual a originalidade de sua produção histórica, sociológica e política?

Silvio Costa_ É muito difícil e poderia parecer pretensioso falar sobre a originalidade de minha produção intelectual, mesmo após meio século de pesquisas e estudos sistemáticos. Mas poderia afirmar, se não original, pelo menos pouco usual, a conclusão que cheguei de as Revoluções só podem ser entendidas como um processo, mais longo, não são o estalar de insurreições que conduzem a rupturas imediatas e definitivas. Enquanto processo, elas concentram em si revoluções e contrarrevoluções, conforme,  por exemplo, o que ocorre na Inglaterra entre 1640 e 1688/89 e na França onde este processo chega após cerca de um século, indo de 1789 ao final do século XIX, em consequência da Comuna de Paris que obriga as classes dominantes [nobreza e burguesia a realizarem uma aliança. Mesmo no Brasil, há um debate se houve ou não uma Revolução Burguesa. Mas, ao considerarmos que não há um modelo de revolução burguesa, podemos afirmar que esta, com suas particularidades, ocorre entre 1888, quando do fim da escravidão formal, e 1945, momento em que o Estado burguês estava consolidado. Veja por exemplo, a grande influência exercida por Getúlio Vargas em nossa História.

Qual a sua contemporaneidade em 2021?

Silvio Costa – Inicialmente é importante deixar evidente que os ensinamentos propiciados pela Comuna de Paris de 1871 não se trata de um receituário a ser seguido. Mesmo porque não há um modelo de Revolução e os acontecimentos históricos não se repetem tal e qual ocorreram, mas podem trazer conhecimentos que nos permitam entender melhor outros. Como, por exemplo, o “Dezoito Brumário de Luís Bonaparte”, título de um livro de Karl Marx, apresenta fatos semelhantes a acontecimentos atuais no Brasil, isto, evidentemente, guardando as particularidades e peculiaridades de ambos, e Comuna de Paris, em síntese é um exemplo manifesto de que é possível, mesmo em situações adversas, construir uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária. Mesmo nesse contexto nacional e internacional, de tempos difíceis e estranhos, não podemos nos calar e ficar em atitudes contemplativas frente às ameaças que nos atingem atualmente. Neste sentido, o conhecimento científico é um importante antídoto e entre este, se destaca a necessidade de ampliar, aprofundar os estudos sobre os ensinamentos históricos. Agindo assim, poderemos conhecer os erros e estabelecer como referências para nossas condutas, os acertos, as práticas corretas e salutares produzidas em nosso processo civilizatório. Infelizmente, mesmo superados historicamente, há aqueles que insistem nos erros e se arriscam a estender a sobrevivência da barbárie tentando divulgar, entre parcelas da população, a compreensão de que rememorar, reviver, acontecimentos passados onde as classes exploradas e oprimidas tiveram protagonismo, não faz sentido. Negam a necessidade do estudo da História e da Ciência. Defendem o ‘negacionismo’. Recusam o conhecimento científico. Acastelam-se em argumentos e práticas identificadas com o genocídio, tornando-se verdadeiros mensageiros da morte.  Continuam argumentando que devemos ser individualistas, irracionais, violentos. Mistificadores, eles se apresentam como cristãos para esconder suas ações e práticas anticristãs. Porém, mesmo nesta situação, ainda adversa, de proliferação de mentiras, de Fake News, de propagação da barbárie e de práticas genocidas, não podemos ficar calados e apáticos. É nossa obrigação resistir e lutar por uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária. Neste sentido, ler, estudar, aprofundar nosso estudo e conhecimento sobre as experiências históricas e em particular, a Comuna de Paris, nos permite perceber que as práticas identificadas com a barbárie, com o genocídio deste [des] governo frente à Pandemia, estão fadadas ao fracasso, à “lata de lixo da História”. Ao mesmo tempo, evidencia que a implantação do ideário neoliberal e militarista – em que pese o poderio e as pressões norte-americanas e europeias – não consegue destruir e liquidar as esperanças de conquistar dias melhores e uma nova sociedade que possibilite à grande maioria viver com dignidade e felicidade. Em síntese, a atualidade dos exemplos da Comuna de Paris é reafirmar que é possível,  necessário e urgente construirmos um mundo novo, solidário e igualitário. O caminho foi iniciado pelos Communards em 1871, em Paris. Caminho em aberto e a ser percorrido!

Perfil

Nome completo_ Silvio Costa

 

Data de nascimento_ 24/03/1953

 

Idade _ 67 e em curto espalho de tempo, estarei com 68 anos

 

Graduação, mestrado, doutorado, estágio pós – doutoral em quais instituições de ensino superior_ Em 1977, concluí o Bacharelado e Licenciatura em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em 1992, o curso de especialização em Política Social na Universidade Católica de Goiás e, em 1994, Políticas Públicas, na Universidade Federal de Goiás. Em 1996, na mesma UFG, o Mestrado em Filosofia e cursou disciplinas nos doutorandos em Sociologia e Política, em Relações Internacionais [América Latina]  e Economia Política da União Europeia, na Universidad Complutense de Madrid, Espanha.

 

Livros publicados_ Tendências e Centrais Sindicais: o movimento sindical brasileiro de 1978 a 1994 [Editora PUC-Goiás/Anita Garibaldi]; Comuna de Paris. O proletariado toma o céu de assalto [Editora da PUC Goiás/ Anita Garibaldi/ Fundação Mauricio Grabois], agora em 3ª edição, e Revolução e contrarrevolução na França. Vol 1: Revolução burguesa e contrarrevolução aristocrática [Editora PUC- Goiás/Anita Garibaldi]; . Organizei Concepções e formação do Estado brasileiro [Editora PUC- Goiás/Anita Garibaldi], em duas edições, e Estado e Poder Político. Do realismo político à radicalidade da soberania popular [Editora PUC-Goiás], em duas edições e reimpressões.

IES que leciona _ Pontifícia Universidade Católica de Goiás

Renato Dias

Renato Dias, 56 anos, é graduado em Jornalismo, formado em Ciências Sociais, com pós-graduação em Políticas Públicas, mestre em Direito e Relações Internacionais, ex-aluno extraordinário do Doutorado em Psicologia Social, estudante do Curso de Psicanálise do Centro de Estudos Psicanalíticos do Estado de Goiás, ministrado pelo médico psiquiatra e psicanalista Daniel Emídio de Souza. É autor de 22 livros-reportagem, oito documentários, ganhou 25 prêmios e é torcedor apaixonado do maior do Centro-Oeste, o Vila Nova Futebol Clube. Casado com Meirilane Dias, é pai de Juliana Dias, jornalista; Daniel Dias, economista; e Maria Rosa Dias, estudante antifascista, socialista e trotskista. Com três pets: Porquinho [Bull Dog Francês], Dalila [Basset Hound] e Geleia [Basset Hound]. Além do eterno gato Tutuquinho, que virou estrela.

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