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Fernando Safatle
Não morro de amores pelo Maduro. Não pelos motivos apregoado pela direita, mas exatamente pelo contrário. Simplesmente porque não acredito que faz um governo de esquerda e nem que seja socialista. Contudo, a Venezuela hoje joga um papel decisivo no redesenho de uma nova configuração da geopolítica mundial.

O desfecho do atual conflito vai certamente definir um novo cenário internacional. Se os EUA derrubarem o Maduro fortalecerá a Doutrina Monroe. Recordemos que a Doutrina Monroe foi estabelecida ainda em 1823, pelo então presidente americano, James Monroe, que definia a hegemonia dos EUA na América, contra a ingerência dos países colonizadores europeus.
A América para os americanos, segundo essa doutrina. Ou seja, como ficou evidenciado durante todos esses anos, a América para os EUA. Com a sua vitória sobre Maduro se restabelece o domínio dos EUA sobre a América, voltando a ser o seu quintal.

Desde Kennedy que os EUA vem perdendo posição na América, despertando agora com a penetração dos chineses por aqui. Caso, Rússia e China firmem posição em apoio à Maduro e impedirem sua derrubada estará modificando significativamente o cenário na América Latina e, porque não, no mundo.

Uma intervenção dos EUA na Venezuela não deixa de mexer no tabuleiro de xadrez do Brasil e de outros países da América Latina como a Colômbia, que discordam da política americana. Tudo faz parte do realinhamento dos EUA perante o mundo, durante o governo Trump. Sua política é de recuperar o terreno perdido como país hegemônico diante do avanço dos Brics, sobretudo, da China.

O EUA é o país mais endividado do mundo com uma dívida de cerca de 39 trilhões de dólares. Sua balança comercial é deficitária em relação a grande maioria dos países que transaciona, exceto o Brasil. O tarifaço é uma medida que procura conter esse déficit. Se vai dar certo é outra coisa, mas é a maneira do Trump conter a sangria de recursos e estancar o declínio da economia americana.

Portanto, a situação da Venezuela se insere nesse contexto geral de disputa pela hegemonia americana no mundo. O petróleo venezuelano e suas reservas gigantescas, é claro, faz parte desse jogo. A cantilena do narcotráfico é mais uma cortina de fumaça inventada pelo EUA para justificar a invasão, tal qual inventaram as bombas químicas no Iraque.

A crise na Venezuela tem outra dimensão, não é apenas um problema do Maduro. Não é por acaso que o Lula fez um pronunciamento na Colômbia ambíguo, porque sabia que muita coisa estava em jogo. Mesmo porque estava metido em saia justa diante de sua posição de questionamento das eleições exigindo as atas.

Mas, questões muito mais relevantes estão em jogo, exigindo uma posição mais firme do Brasil diante da ameaça da soberania não apenas da Venezuela, mas da América Latina como um todo. A frota de navios, com mais de 10 mil fuzileiros estão navegando pelas águas do Caribe mais de mês, em uma movimentação para amedrontar o Maduro. Até agora não se sabe se é uma manobra aterrorizante ou é de cautela com receio da reação da Rússia e China. Ninguém sabe ao certo. Uma coisa é certa, está se configurando um novo desenho na geopolítica do mundo.
Fernando Safatle é economista














