Apóstolo da violência
Morte não lava sua biografia
Henry Kissinger 1923_2023
Renato Dias
Alemão naturalizado americano, ele conspirou para derrubar o presidente da República do Chile, Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973, deu aval ao golpe de Estado civil e militar na Argentina, de 24 de março de 1976, enlameou-se na guerra Vietnã e apoiou a ditadura no Brasil. Um currículo fundado na violência. Veja: na guerra. Longe da lógica da paz. O de Henry Kissinger. Nascido em 1923 e morto em 2023. Aos 100 anos de idade. Nos EUA.
Senhor das guerras, ele abençoou a criação, em 1975, no Chile, da Operação Condor, multinacional da repressão aos dissidentes políticos do Cone-Sul. Ao lado de Gerald Ford, também deu aval para a Indonésia ocupar, em 7 de dezembro do mesmo ano, o Timor Leste. A invasão durou 25 anos, 1/4 de século. O bombardeio do Camboja tem as suas impressões digitais. A sua Política Externa causou quatro milhões de mortos, conceituadas como “danos colaterais”.
Conselheiro de Segurança Nacional, além de secretário de Estado, o professor de Oxford serviu tanto a Richard Nixon, quanto a Gerald Ford, dois inquilinos da Casa Branca. Um personagem conservador do século XX, adepto da cultura da guerra fria, o diplomata operou sob o mantra da velha “Realpolitik”. Com uma orientação pragmática. Mais: nada fez para impedir graves violações dos direitos humanos no Brasil. Como aponta um documento secreto da CIA de 1974.
Para enfraquecer a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas [URSS], o taciturno bruxo liberal da Geopolítica Mundial fez os EUA estabelecerem relações com a China socialista, em 1972. Richard Nixon e Mao-Tsé-tung celebraram um insólito pacto. Como um castelo de cartas, o socialismo realmente existente ruiu. Em tempo: Rússia e a China, hoje, são rivais dos Estados Unidos das Américas, envolvidos em 2023 em conflitos no Oriente Médio e Ucrânia.
O que diz a Academia
Consultor de Segurança Nacional para a Política Externa dos Estados Unidos das Américas sob a Guerra Fria [1945-1991], o diplomata Henry Kissinger [1923-2023] é o responsável pela geração de ódio e ressentimento contra a Casa Branca em escala mundial. A avaliação é do professor doutor de Ciências Sociais, da Universidade Federal de Goiás, Carlos Ugo Santander.
Pesquisador marxista, o professor doutor de História Contemporânea da Faculdade de História da UFG, David Maciel, afirma em um tom ácido que o ex-secretário de Estado dos EUA era sim um operador da preservação da Ordem do Capital. Em uma Era de Revoluções e crises do capitalismo, observa o docente. Pragmático, ele foi um contrarrevolucionário, sublinha.
Um criminoso de guerra?
Ícone da guerra fria
Sociólogo graduado na Universidade de São Paulo [USP], Julio Turra diz ao Portal de Notícias www.renatodias.online que Henry Kissinger era um criminoso de guerra. O trotskista refere-se à guerra do Vietnã, ao ataque ao Camboja, além dos golpes de Estado na América Latina nos anos 60 e 70.
Diplomata que moldou o século XX. Assim o historiador e jornalista Frederico Vitor de Oliveira conceitua-o. Os seus cálculos geopolíticos levaram os EUA a derrotarem a URSS, frisa. Ele aproximou a China da White House, pontua. A sua arquitetura inundou o Cone-Sul de ditaduras, põe o dedo na ferida.
Mais: um diplomata do imperialismo, Henry Kissinger orquestrou a derrubada de Salvador Allende, em 11 de setembro de 1973, no Chile, e de Estela Martinez de Peron, no dia 24 de março de 1976, na Argentina, informa a ex-deputada estadual Isaura Lemos. Com dezenas de milhares de mortes, atira.
Com a voz mansa, elevada astúcia e um raro preparo intelectual, Henry Kissinger foi o articulador de Richard Nixon e Gerald Ford para ampliação da indústria bélica dos EUA, m inimigo da paz mundial e do respeito aos direitos humanos. Crítica, a análise é do historiador Reinaldo de Assis Pantaleão.
Um ícone da guerra fria, resume o operador do Direito e analista da Geopolítica Mundial Fernando Dolci. O observador lembra que com Richard Nixon o Partido Republicano adota uma ideologia de extrema direita. Figura controversa, malévola, avalista da Operação Condor, no Cone – Sul, fuzila.
Em tempo: o professor de História Fred Frazão, um trotskista, classifica-o com canalha e facínora. Eles também morrem, dispara. Registro: com milhares de cadáveres, desabafa. No Vietnã, Camboja, Chile e Argentina, denuncia. Não podemos esquecer nunca os mortos de sua Política Externa, metralha.
Obituario con hurras
Mario Benedetti
Dedicado por Jair Krishke
Vamos a festejarlo
Vengan todos
Los inocentes
Los damnificados
Los que gritan de noche
Los que sufren de día
Los que sufren el cuerpo
Los que alojan fantasmas
Los que pisan descalzos
Los que blasfeman y arden
Los pobres congelados
Los que quieren a alguien
Los que nunca se olvidan
vamos a festejarlo
vengan todos
el crápula se ha muerto
se acabó el alma negra
el ladró
el cochino
se acabó para siempre
hurra
que vengan todos
vamos a festejarlo
a no decir
la muerte
siempre lo borra todo
todo lo purifica
cualquier día
la muerte
no borra nada
quedan
siempre las cicatrices
hurra
murió el cretino
vamos a festejarlo
a no llorar de vicio
que lloren sus iguales
y se traguen sus lágrimas
se acabó el monstruo prócer
se acabó para siempre
vamos a festejarlo
a no ponernos tibios
a no creer que éste
es un muerto cualquiera
vamos a festejarlo
a no volvernos flojos
a no olvidar que éste
no es un muerto cualquiera
vamos a festejarlo
a no volvernos flojos
a no olvidar que éste
es un muerto de mierda.