De revolucionário a cachorro?
Complexas teias de explicações
José Anselmo dos Santos e Sérgio Fleury
Uma história a ser elucidada
Renato Dias
Os dois derrubaram uma garrafa de uísque. Em um suposto aparelho, imóvel que servia para esconder clandestinos. Sob a ditadura civil e militar. Ano: 1971. O inusitado. O primeiro era José Anselmo dos Santos. Trata-se do ex-presidente da Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais, em 1964. Um dos pivôs do golpe de Estado. O segundo, um homem do Esquadrão da Morte, da Polícia do Estado de São Paulo, Sérgio Paranhos Fleury, alto e obeso. Um consumidor de cocaína e que vivia com as pupilas dilatadas. Diálogos com o mesmo projeto. O de liquidar com a luta armada no Brasil. Tempos sombrios aqueles.
A suposta versão para a queda
A versão apresentada é que José Anselmo dos Santos teria ido conversar com atletas cubanas, na capital paulista. Edgar de Aquino Duarte observava a cena à distância. Os dois teriam sido presos. Após oferta de Sérgio Paranhos Fleury, já delegado do Deops [SP], ele aceita colaborar com a repressão política e militar e passa a delatar os seus contatos na Vanguarda Popular Revolucionária e na Ação Libertadora Nacional. Os cadáveres começaram a ser empilhados e desaparecidos. Com um salário, apartamento, privilégios, vira um cachorro. Um infiltrado. Agente duplo. Um facínora a serviço da caserna.
José Anselmo dos Santos é preso em maio de 1971, em São Paulo. Ele para no Deops [SP]. Sem ser torturado, aponta José Duarte dos Santos. Três dias depois, acende um cigarro e diz a Sérgio Paranhos Fleury que aceita colaborar e entregar os seus velhos companheiros de luta armada. Veja, na sequência, Aluísio Palhano cai e morre em maio. Edgar Aquino Duarte: preso em 13 de junho e desaparecido em junho de 1973. Luís de Almeida Araújo obtém a mesma sina. Paulo de Tarso Celestino da Silva, 12 de julho de 1971. Heleny Telles Guariba, 12 de julho de 1971. Ex-sargento José Raimundo da Costa: 5 de agosto de 1971
História retrospectiva
Não custa lembrar. José Anselmo dos Santos retorna ao Brasil, oriundo de Cuba, em 15 de setembro de 1970. Em tempo: Edson Neves Quaresma e Yoshitane Fujimore são executados em 5 de dezembro do mesmo ano. Antes da suposta mudança de lado do ‘famoso’ ex-presidente da Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais. Registro histórico: duas mortes sem explicações plausíveis para o Comitê Central [CC] da Vanguarda Popular Revolucionária. Duas execuções extrajudiciais de quadros políticos experientes na capital paulista. A quem devem ser atribuídas as trágicas quedas significativas à organização?