Geração 68 grita: Fora, Bolsonaro!
Geração 68 grita: Fora, Bolsonaro!
Betty Almeida
Jair Messias Bolsonaro pensou que podia tripudiar sobre todos e ocupar estradas com seus milicianos montados em motocicletas. Pensou que era o rei do gado, o dono da rua. Que se alguém se metesse a besta, bastava dizer alguns palavrões para calar as bocas discordantes.

Não se deu conta de que sua pressão sobre sindicatos, partidos políticos de oposição, movimentos sociais não dobra um povo. Para trabalhadores à moda antiga, uberizados, desempregados, desabrigados, estudantes, povos originários, mulheres em busca de direitos e afirmação e todo tipo de representantes do gênero humano, paciência tem limites.

Ele, sobretudo, não contou com aqueles que eram jovens quando enfrentaram perseguição, prisão, tortura, morte ou fuga para o exílio quando o país vivia sob o tacão de uma ditadura militar.

Hoje septuagenários, lembrando as antigas lutas, que a maioria nunca abandonou, levantaram juntos suas vozes, vestiram as mesmas camisas e saíram às ruas em todo o país, como em outros tempos, com a mesma sede de justiça social, de liberdade e a mesma vontade de construir um país e um mundo melhores.
Na tarde de inverno ensolarada em Brasília o grito de Fora Bolsonaro, Ditadura Nunca Mais ecoou como em centenas de cidades brasileiras e muitas no exterior. As faces enrugadas meio cobertas pelas máscaras, coroadas pelos cabelos brancos, saíram em fila do estacionamento do Teatro Nacional até o Museu Honestino Guimarães, onde se juntaram à massa dos mais jovens.
Depois de terem suas mochilas e bolsas revistadas pelos policiais meio constrangidos, todos percorreram o pedaço de Esplanada que lhes é permitido, porque desde que o genocida se instalou no Palácio do Planalto, o espaço diante do Congresso e a Praça dos Três Poderes não são mais do povo.
Nas camisetas e bandeiras, todas as cores, todo o arco-íris. Nos cartazes todas as palavras de ordem contra o capitão a serviço dos patrões. Na imensa bandeira verde e amarela inscrevia-se em vermelho a cobrança pelas mortes de mais de 500 mil pessoas.
No caminhão de som, todas as vozes, todos os chamados, poemas, canções e todos os apelos, principalmente por vacina no braço e comida no prato. O batuque dos tambores dava ritmo e transmitia energia. O PDT estava presente com a foto de Brizola. Ambulantes, em suas barraquinhas portáteis, vendiam faixas, adesivos, bandeiras, além de água e outras bebidas.

Mas esta manifestação já não era catarse como as primeiras, não era só a pura alegria de voltar às ruas, quando muitos levaram crianças, outros foram em suas cadeiras de rodas ou bicicletas e levaram seus cachorros para passear. Desta vez, era a vontade indignada de protestar, de botar o bloco na rua para lutar contra o horror que assola o país.
Com apenas 17% da população vacinada, a massa era rarefeita na Esplanada, caminhava-se afastado, mas com os corações e as mentes muito próximos. A geração 68 carregou sua faixa com orgulho e foi aplaudida por jovens alegres e agradecidos por seu exemplo e fidelidade aos ideais que a juventude de hoje compartilha.
1968, 26 de junho
Fora Collor queria o fim de um governo corrupto. O Fora Bolsonaro quer o fim de um governo não só corrupto, mas autoritário e destruidor da economia e do patrimônio do país, um governo capaz de deixar vidas se perderem enquanto procura lucrar com negociatas escusas e tabelar propinas. Um governo indiferente ao sofrimento do povo, que escarnece da dor de quem perdeu os seus. Que compra apoios com altos salários, astronômicas emendas parlamentares e deixa o povo passar fome.

O nó nas tripas de Bolsonaro não teve o mesmo efeito da facada. Ele não tentou pôr seus bolsominions na rua depois que começaram as manifestações. Já não engana ninguém. Seu balcão de negócios no Congresso tenta salvar sua indefensável cabeça, culpada por mais de meio milhão de mortes. Mas o bloco da Geração 68 está na rua. Vai balançar Bolsonaro, até ele se desequilibrar de vez e cair de podre.

Betty Almeida é escritora